Atualmente muitos DJs optam por digitalizar o seu vinil e por razões diversas: para continuar a tocar as suas músicas sem desgastar o vinil, por conveniência e também porque preferem utilizar o vinil somente em alguns eventos, já que carregar uma mala cheia de vinil é pesado e o DJ precisa ter força física e também espaço disponível para transportá-los. Quaisquer que sejam os motivos de cada DJ, o objetivo fundamental do processo é claro: capturar o som da melhor maneira, obtendo a máxima qualidade possível de seus discos e assim oferecer a melhor qualidade musical quando se toca na frente do público.
Muitas pessoas digitalizam os discos de forma bastante rudimentar, simplesmente conectando a saída de gravação da sua mesa de DJ a uma interface de áudio ou utilizando um toca-discos barato com uma porta USB integrada, gravando o sinal como 44.000/16Bit e depois comprimindo o resultado em um MP3. Cuidando de alguns detalhes, investindo dinheiro e adicionando um pouco de conhecimento, você poderá obter resultados notavelmente melhores. Preparado? Bom, então pegue o seu vinil, porque começaremos agora.
Os toca-discos de DJ não são perfeitos.
Os toca-discos profissionais para DJs com sistema direct drive oferecem uma estabilidade muito boa pelo preço que eles têm. Para fazer uma comparação, o clássico Technics SL-1200MK2 possui uma oscilação na velocidade de reprodução wow / flutter de 0,025% WRMS (esta medição é feita sem vinil ou agulha, a medida é feita diretamente do motor). Para conseguir algo semelhante no toca-discos de Correia/Cinta de Borracha você teria que adquirir um modelo da Thorens Prestige que pode custar-lhe cerca de R$25.900,00 e isso sendo de segunda mão.
No entanto, a qualidade de som oferecida pelos toca-discos de DJ é diferente: os motores de direct-drive têm uma engrenagem que apresenta vibrações que ressoam no “braço” do toca-discos e afetam a qualidade final do som. Além disso, as fontes de alimentação internas deste tipo de toca-discos podem afetar o som, introduzindo um tipo concreto de ruído de fundo definido como Humming. As agulhas e cápsulas usadas no “território DJ” não são projetadas para oferecer o melhor som, e sim o melhor equilíbrio entre qualidade de som, aderência e desgaste. Isso normalmente ocorre porque os DJs constantemente manuseiam o vinil durante a sua reprodução. O Dj precisa ter uma boa agulha para que o som tenha a melhor qualidade possível. Agulha de menor qualidade tende a “pular” durante a passagem do disco, afetando negativamente no desempenho e na qualidade do som.
Não pense em comprar os toca-discos especiais para digitalizar.
É frequente encontrar toca-discos para DJS em que os modelos têm a aparência semelhante aos modelos profissionais, embora sejam feitos com materiais plásticos e tenham uma interface de áudio USB, sendo possível conectá-los a um computador e também capturando o áudio diretamente. Estes toca-discos geralmente têm um preço que se move de R$630,00 a R$927,00 e comumente já está incluso no valor a cápsula e a agulha. Eles são comercializados com embalagens especiais e um marketing agressivo, claramente orientado para convencê-lo de que eles são ideais para se digitalizar o vinil. Mas nem pense em usar esses toca-discos!
Estes tipos de toca-discos são fracos em qualidade de construção, pois não possuem nenhum material de isolamento adequado. Além disso, a interface de áudio geralmente tem uma resolução de apenas 16 bits e 44kHz com conversores de qualidade duvidosa. Eles utilizam motores direct drive com pouca força e também 4x mais oscilação na velocidade de reprodução do que um toca-discos profissional. A cápsula e a agulha incluídas são de baixa qualidade, geralmente barata, com um valor real um pouco superior a R$92,00. Em minha opinião, acho que este tipo de toca-discos pode ser adequado para um consumidor de vinil ocasional, ou seja, que quer utilizá-lo apenas com o objetivo de fazer uma cópia digital para ouvir as suas músicas em um leitor Mp3 portátil ou no smartphone. Se possível, é melhor utilizar mais de uma categoria de toca-discos. Assim será melhor para digitalizar a música de um DJ e, mais ainda, se essa digitalização for ser utilizada para tocar na frente do público.
Use o disco de borracha;
O famoso disco de borracha incluído nos toca-discos para DJs (e que normalmente estão sendo substituídos por um velcro para permitir lidar com o vinil a toda velocidade) será um bom aliado para a digitalização. O disco de borracha aumenta a aderência na bandeja giratória e a borracha aumenta a absorção de possíveis vibrações. Todos os toca-discos Technics vêm com um disco de borracha, segundo informa o fabricante. Mas caso você não tenha um e precise comprar, a referência do componente de disco de borracha do Technics é o RGS0008, podendo ser encontrado em algumas lojas do ramo. E ele serve para qualquer toca-discos.
Posicione o prato corretamente e se possível substitua os apoios.
Para evitar qualquer tipo de vibração que afete a digitalização do seu vinil, coloque o toca-discos em uma superfície sólida, pesada e estável. Se você tiver uma mesa de madeira sólida que não fique tremendo e que aparente ser estável, pode ser a superfície ideal. Se possível, não apoie na superfície materiais que possam emitir vibrações: computador, alto-falantes, aparelhos elétricos, etc.
Se você puder pagar, substitua os suportes do seu toca-discos por um Isonoe, pois eles o ajudarão a reduzir o impacto das vibrações em sua gravação. Estes suportes são compatíveis com a maioria dos pratos de DJ.
Como manusear corretamente o vinil para digitalização.
Você deve cuidar do vinil começando pelo seu armazenamento. Quando você terminar de usar o seu vinil, segure-o pelos lados, evitando tocá-lo na superfície onde estão os sulcos. Dessa forma, evitamos depositar a sujeira e o suor das mãos no disco. Para mantê-lo bem e conservado, deixe-o sempre na bainha de papel que está dentro da pasta de papelão, assim você vai evitar que ele seja arranhado. Além disso, se você puder pagar, compre envelopes de plásticos transparentes para envolvê-los e preservá-los por mais tempo.
Sempre armazene os discos verticalmente e lado a lado. Não os empilhe da forma como “um em cima do outro”, pois isso permitirá que eles se ondulem, ou a reprodução salte e tenha pequenas alterações no tom da música. Os vinis também podem se deformar ou se ondular se forem submetidos a muito calor.
Se algum dos seus vinis já está ondulado ou riscado com arranhões não muito profundos, às vezes pode ser possível evitar os saltos na reprodução, manuseando o contrapeso, reduzindo o máximo possível e até mesmo adicionando um pouco mais de peso para a cápsula colocando sobre ela uma pequena moeda. Isso irá forçar a agulha a entrar em contato com o sulco e, embora isso provavelmente altere um pouco o som, pelo menos lhe dará uma reprodução contínua. O uso de pesos também é aconselhável, pois ele pode sutilmente melhorar o som, especialmente se o disco estiver um pouco torto, pois, ao colocar um peso no centro, pode-se obter um pouco de achatamento, bem como reduzir as vibrações. Os mais populares são os MasterSounds.
Antes de digitalizar os discos, passe sobre eles uma escova de limpeza para vinis. Dessa forma, você irá remover toda a poeira que houver na superfície. Para uma limpeza minuciosa de suor e sujeira, você precisará limpá-los com uma solução de água e sabão neutro sem gordura e uma esponja lisa – o removedor de maquiagem ajuda bastante na limpeza, mas desde que ele não tenha produtos químicos adicionados em sua composição – Em seguida enxágue-os com água corrente, mas tome cuidado para não molhar a etiqueta do centro. Depois deixe-os escorrer e secar ao ar livre( ou utilize um escorredor de prato, se julgar mais fácil). Tente usar água fria. Há pessoas que recomendam o uso de álcool isopropílico para a limpeza do vinil, mas acho agressivo utilizá-lo diretamente, talvez o ideal seja adicionar à solução um pouco de água e sabão. Com uma limpeza minuciosa, você eliminará o ruído de fundo do vinil e até melhorará o som. Para que isso ocorra, o sulco deverá ser totalmente limpo.
Existe um método de limpeza manual que pode ser o mais eficaz de todos (mas também é o mais caro, demorado e trabalhoso), que consiste em cobrir cada lado do vinil – menos a etiqueta – com uma camada de cola de carpinteiro branco. Em seguida deixe-os secar e quando estiverem totalmente secos, retire o excesso de cola. É um método que deve ser utilizado para deixar um vinil especial com uma aparência bem limpa, bonita e perfeita.
Use uma cápsula e uma agulha adequadas.
As agulhas são muito caras e todos os Djs de vinil sabem muito bem disto. Então, se você estiver pensando em investir em uma cápsula e uma agulha que podem servir para digitalizar e tocar (aconselho que você tenha duas cápsulas: uma para tocar e outra para digitalizar e só utilize a agulha se for realmente necessário), você precisa entender algumas questões:
1. As cápsulas que utilizam agulhas elípticas dão melhores resultados de som do que as agulhas esféricas, mas também causam maior desgaste no vinil.
2. Muitos poucos modelos de cápsulas de DJ são especialmente recomendados para digitalização de vinil. Em geral, são cápsulas projetadas para oferecer muito volume de saída, boa aderência ao disco e pouco desgaste. Apesar disso, eles comumente têm mais ruído do que as cápsulas de alta fidelidade e a sua resposta geralmente não excede os 18kHz, além dos agudos muitas vezes apresentarem falta de definição.
3. Uma das cápsulas mais difundidas entre os DJs de vinil é a Ortofon Night Club MK2, porém tome cuidado: embora esta cápsula seja famosa por ter um som muito poderoso para a música eletrônica, ela também tem uma tendência de “colorir” o som exagerando com os graves e, pelo alto nível de volume 8mv, a Ortofon apresenta alguns tipos de ruído. Se você digitalizar músicas de clube, como pop, rock ou outros estilos, esta cápsula pode não ser a ideal. Se você quiser digitalizar exclusivamente músicas dance uma Ortofon Night Club MK2, pode ser o investimento certo (ela custa R$570,00).
4. Embora o Shure Whitelabel tenha o mesmo preço que o Night Club e menos níveis de saída de volume, esta cápsula não colore o som e é mais versátil, podendo lhe dar bons resultados com discos de todos os estilos.
5. Se você está disposto a investir um pouco mais do que o habitual, a Grado DJ200i é uma versão especial de uma cápsula HI FI e agora ela criou uma versão para DJ. O custo desta cápsula é R$1000,00. Ela é importada e justifica o investimento com uma riqueza de som muito próxima das cápsulas de alta fidelidade, ainda que não seja adaptada para scratch.
Cápsulas Hi-Fi.
Se você tiver condições financeiras suficientes para investir em alguns componentes Hi-Fi, você obterá resultados realmente notáveis. Porém, cuidado: de que adianta gastar muito dinheiro em uma cápsula muito cara, se o resto dos seus equipamentos não for compatível e à altura dela? Aí você poderá estar literalmente “jogando dinheiro fora”.
Embora todas as cápsulas de DJ sejam de ímã móvel-Moving Magnet, MM– no hi-fi você pode encontrar tanto o tipo de imã ou de bobina móvel –Moving Coil, MC–. A cápsula de bobina gera um sinal de áudio cerca de 10 vezes menor do que o gerado por cápsulas de ímãs móveis e geralmente elas não funcionam corretamente com a saída phono do mixer que os DJs utilizam. Elas precisam de amplificações específicas para esse tipo de cápsula. Em troca, você obtém uma melhor imagem estéreo, um som mais detalhado, uma melhor relação sinal-ruído, sem distorções estranhas em altas frequências. Porém, o valor destas cápsulas é três vezes maior do que as outras. Também nota-se que existem fabricantes de cápsulas de MC que não fabricam agulhas para ser substituídas pelo usuário e devem ser enviadas para um serviço especializado para a substituição, aumentando assim o custo das cápsulas.
Por outro lado, se você decidir comprar uma cápsula Hi-Fi MM ou uma MC, provavelmente você não vai tirar proveito deste investimento se você ligar o seu toca-discos diretamente na mesa de Dj. É preferível comprar um conector phono dedicado a HI FI e integrar um conversor A/D (Analógico/Digital) para poder conectá-lo diretamente ao computador e digitalizar.
Veja abaixo o valor de investimento para uma configuração de cápsula HI-FI MM e um pré-amplificador phono:
Cápsula Ortofon 2M Bronze PNP – R$ 1800,00
Pré-amplificador phono ADL GT40 – R$ 2000,00
O ADL GT40 pode pré-amplificar o sinal tanto de uma cápsula de MM quanto de uma MC (caso você queira, no futuro, melhorar o seu sistema de digitalização). Alguns exemplos de cápsulas MC podem ser:
1. Hana EH – R$ 1500,00 – cápsula muito boa e considerável por oferecer um agudo de qualidade, ser pouco barulhenta e disponibilizar uma boa resposta e estabilidade, mesmo para vinis antigos e deteriorados. Dê uma olhada:
Audio Technica AT-OC9 III – R$ 4000,00 – cápsula muito equilibrada e com uma resposta global ideal em todos os aspectos. Confira:
Goldring Eroica LX – R$ 2500,00 – cápsula que fornece um baixo muito bem definido e um som geralmente bastante transparente. Observe:
Definitivamente, você pode obter um som melhor usando componentes Hi-Fi top de linha, mas você deve ter em mente que o valor investido será alto, então é preciso avaliar em um nível pessoal se vale a pena investir tanto dinheiro na melhoria do som. Obviamente, se você é um amante de som de vinil, este investimento sempre poderá ser reutilizado para ouvir os seus discos preferidos ou então se você é um DJ que passou a utilizar o modo digital e tem algum disco que gosta muito de tocar nos seus Djs Set.
Fundamento do áudio digital para entender o que vamos fazer.
Bem, explicamos os elementos físicos que precisamos para digitalizar o vinil. Agora entramos no terreno do intangível e, mais especificamente, do áudio digital. Ter um pouco de conhecimento de como o áudio digital funciona (especificamente o PCM, já que o DSD é usado atualmente na música de alta resolução e, em matéria de digitalização de vinil, deixe-o de lado porque ele não pode ser utilizado para tocar), irá ajudá-lo a entender melhor o que você está fazendo e a razão disso.
É bastante comum que as pessoas utilizem diretamente uma resolução de 16 bits ao digitalizar o vinil e uma frequência de amostragem de 44,1 kHz, que é a resolução padrão usada nos CDs I, suficiente para se fazer uma boa captura. Se houver meios adequados, vale a pena tirar proveito deles. Para entender por que vale a pena conhecer dois fatores que afetam essa precisão: a profundidade de bits e a frequência de amostragem. Dois fatores que “de uma forma simples” podemos associar ao ruído que irá introduzir a codificação com a largura de banda máxima que pode ser gravada.
Frequência de Amostragem.
Quando digitalizamos o áudio começamos com o sinal de áudio analógico (que se desenvolve continuamente ao longo do tempo) e ele apenas armazena seu valor em um determinado instante específico. E este valor (nível) em um sistema de gravação digital, quando armazenado, será representado por números. Essas capturas em certos instantes são chamadas de amostras, daí o nome da taxa de amostra, pois elas expressam o número de amostras que extraímos do áudio por um segundo. Por exemplo, 44,1 kHz significa que cada segundo de áudio faz 44,100 amostras. Da mesma forma, 48 kHz significa que capturamos 48.000 amostras a cada segundo. Mas qual diferença percebe-se na música por ter mais ou menos amostras por segundo?
Alguns pensam que realmente 22 kHz (22.000 amostras por segundo) são suficientes para capturar qualquer som que um ser humano possa ouvir, já que está acima dos 20kHz, o que geralmente é considerado como limite de audição, mas isso não é bem assim: para capturar corretamente um som, a frequência de amostragem deve ser maior do que o dobro da frequência mais alta que o som possa alcançar. E isso não são palavras minhas, mas do teorema de Nyquist-Shannon, que iremos falar mais adiante para não complicar ainda mais as coisas. Para explicar de uma forma mais fácil, acompanhe o exemplo: se o sinal de 20 kHz sobe e desce 20.000 vezes por segundo, nós precisamos de pelo menos duas amostras por ciclo (ou seja, 40000 amostras por segundo ou mais) para capturar tanto o seu alto impulso quanto o seu impulso mais baixo.
Então, qual a razão de se gravar em 48khz se não podemos ouvir estas frequências? Pois quanto maior a frequência de amostragem, maior o sinal de áudio a ser capturado. Mas este não é o real objetivo.
Vou tentar explicar de uma forma mais simples (e espero que os engenheiros de áudio não fiquem chateados comigo): um sinal sinusoidal que alcança os 15Khz está no limite da possibilidade humana de ser ouvido, e quem captura este sinal de áudio é um filtro interpolar que faz parte dos nossos conversores A/D da nossa interface de áudio. Este filtro interpolar preenche com sinais de áudio entre as amostras. Quanto mais amostras por segundo, mais o filtro interpolar irá fazer um trabalho cada vez melhor. Quando um sinal de áudio com largura de banda é limitada a 20kHz ele é representado digitalmente em fs (fs = amostra por segundos). Com 44.1kHz, os filtros são mais difíceis de implementar do que quando a amostragem é de 48kHz. A “folga” fornecida pelos 48kHz permite uma reconstrução mais bem sucedida com menos defeitos secundários e o som resultante será melhor. Sobre esse argumento, há um amplo debate que daria não apenas para uma matéria, mas talvez um livro inteiro.
Vamos entender o que são os BITS.
Para explicá-lo de forma simples, os bits definem o nível de detalhe para o qual capturamos a amplitude, ou seja, o “nível” de um sinal de áudio. Se capturarmos um sinal em 16 bits, teremos uma escala de 65.536 pontos (este valor é 2 elevado a 16 e dá como resultado 65.536) para medir a amplitude de cada uma das amostras que tomamos a cada segundo. É necessário muitos fragmentos para definir com precisão a amplitude de um sinal analógico, mas com a tecnologia de hoje podemos ir muito mais longe. Cada vez que acrescentamos Bits multiplicamos por dois o número de níveis e consequentemente também aumentamos em dois a precisão. Assim, se usarmos 24 bits teremos 16,777, 536 (este valor é 2 elevado a 24 e dá como resultado 16,777, 536) pontos para medir a amplitude, ou seja, quanto mais pontos, mais precisão. Além disso, quanto mais definição, mais estaremos aumentando o nível dinâmico da música, e assim iremos do 96dB que possamos obter com 16 bits para os 144dB que oferecem os 24 bits; embora esses 144dB são teóricos, na verdade os conversores geralmente não chegam lá. Para lhe dar uma ideia, o mixer Rane MP2015 que tem a fama de ter os melhores conversores no mercado, oferece 116dB no máximo.
Pensemos por um momento sobre a gama dinâmica de vinil. Geralmente ela é cerca de 60dBs. Assim, os 16 bits e seus 96dB teóricos não são uma escolha tão ruim. A principal vantagem na escola dos 24bits para digitalizar o vinil se dá no momento da gravação e você se livra de ter que alinhar níveis: você pode gravar sem ir a ‘full scale’ e depois normalizar, sabendo que o nível de ruído por quantização é tão baixo que esta normalização não vai fazer com que o ruído possa ser percebido, já que o ruído do vinil em si continuará a ser maior. Para ser mais exato, podemos gravar em 24 bits e após o áudio ser normalizado, podemos salvar a 16 bits. Além disso, você economizará espaço no disco rígido.
Então, qual seria a coisa certa a se fazer?
Para resumir o que vimos até aqui, lembre-se: se você tiver uma interface de áudio de 24 bits, aproveite a sua margem dinâmica durante a gravação e, em seguida, normalize e salve o arquivo em 16 Bits. Dessa forma você poderá guardar espaço de armazenamento no Hard Disk. Sobre a frequência da amostragem, se a sua cápsula não for capaz de reproduzir nada acima de 18khz, então você pode escolher a 44,1 kHz. Mas se você tiver uma boa cápsula que vá além, aproveite a de 48 kHz que poderá servir muito bem.
Existem resoluções superiores a 44.1kHz e 48.1kHz, que são as de 96 e 192 kHz. Imagine o nível de detalhe que é possível capturar com uma resolução assim. Mas precisamos ser práticos: quantos CDJS são possíveis de reproduzir em arquivo de áudio nesta resolução? Especificamente existem apenas dois CDJS no mercado capazes de reproduzir arquivo com esta resolução: o Pioneer CDJ-2000NXS2 de DJ e o Denon SC5000 Prime. Embora o software para DJs possa usar arquivos nesta resolução, o seu computador estará sujeito a uma carga de processamento muito maior.
O software e o processo de gravação.
Não há a necessidade de usar um software sofisticado e caro para executar a tarefa de digitalizar o vinil. Se você já comprou um bom editor de áudio, continue usando ele. E caso não possua nenhum, você pode utilizar o Audacity, que é grátis, fantástico e vai te atender bem. Como o Audacity é um software gratuito, a informação desta seção será baseada neste programa:
Primeiro, configure o software para capturar o áudio para a resolução desejada. Depois vá para “Preferências” e em seguida a guia “Qualidade”, e então você terá duas opções para escolher a frequência de amostragem e a profundidade do bit. Nos dois menus abaixo, é possível escolher o tipo de conversão em tempo real selecionando em Best Quality (Slowest).
Antes de começar a gravar, ative o monitoramento em tempo real durante a gravação. Vá para as preferências na guia “Gravação” e verifique a opção “Reproduzir” através do software ( não escolha reproduzir através do hardware, aconselho esta escolha de configuração porque talvez algo falhe no software durante a gravação e você não perceba por estar ouvindo diretamente o sinal que entra na interface, e não o que o software está gravando.
Agora feche as preferências e monitore o nível de sinal que está entrando. Vá até o topo do medidor à esquerda e você verá que tem um ícone que, ao pressionar, exibirá um menu com a opção de “Iniciar monitoramento”. Ative esta opção e comece a reproduzir o disco. Você não está ouvindo nada ou o medidor não está mostrando nada de sinal de áudio? Certifique-se de que a interface em que o toca-discos está conectado é selecionada na tela principal do Audacity. Geralmente na parte inferior do painel da ferramenta de software, você tem algumas opções para escolher o dispositivo de entrada e saída que irá usar. Assim que você tiver um sinal de entrada, reproduza as partes mais intensas do disco e ajuste o ganho de entrada para que o sinal no medidor VU da Audacity nunca atinja 0dB. Eu pessoalmente brinco muito com esta margem, pois eu registro em 24 bits e consigo ficar em -4dB. Como já explicamos anteriormente, se você estiver gravando em 24 bits não precisa ter um nível de entrada de sinal de até 0dBs e tentar ter uma margem dinâmica, já que mais tarde você poderá normalizar o áudio sem problemas.
Uma vez que tudo esteja pronto para gravar, certifique-se de que o controle de pitch do prato ( se você estiver usando um que tenha pitch), está em 0% e coloque a agulha no início do disco. Clique no botão “Gravar”, inicie o disco e deixe gravar todo o lado do disco de uma vez.
Problemas e dificuldades comuns após a gravação.
Tudo está na mesma faixa.
Se você seguiu as instruções, todo o lado do disco será gravado na mesma faixa de áudio. E se for um EP ou um álbum com várias canções por lado, será uma após a outra. Se você nunca utilizou um editor de áudio não se preocupe, pois o Audacity é bastante simples e você pode separar tudo manualmente. Com o botão esquerdo do mouse arraste e selecione a música (em formato de áudio) que você quiser separar. Depois de tê-la selecionado, vá para o menu superior e escolha “Track / Add tag in seletion” (se o programa estiver em inglês). Você verá que na parte inferior da pista de áudio há uma linha de tempo que marca o princípio e o final da música que você selecionou e no centro tem uma caixa de texto para que você possa escrever o nome da música e do autor.
Continue com esta técnica até que você tenha marcado todas as músicas. Para finalizar escolha a opção “Exportar Múltiplo”. Na janela emergente, escolha o formato e os detalhes dos arquivos que serão exportados.
O áudio de um canal é mais alto do que o outro canal.
Este problema muitas vezes é bem sutil para se perceber com os ouvidos, mas “graficamente” se vê claramente o problema nos indicadores de nível do áudio e nas formas de onda de cada canal. É possível que se tenha uma diferença de volume por questões relacionadas com o estado do vinil, que pode ser pela ondulação ou então a cápsula / agulha do toca-discos pode estar mal alinhada – os dois problemas fazem com que a agulha não tenha o mesmo contato em ambos os lados do sulco, como também pode ser que o braço do toca-discos esteja mal equilibrado – o anti-skate, os cabos elétricos ou o áudio podem estar com problemas … Se em um primeiro momento você não conseguir resolver o problema fisicamente no toca-discos, o resultado será descompensação entre os dois canais, mas é possível consertar e minimizar isto no editor de áudio.
No Audacity é bem simples solucionar este problema: primeiro você precisa separar os dois canais clicando no canal esquerdo que apresenta uma forma de onda (logo acima onde se coloca a resolução do arquivo). Assim que você clicar lá, haverá um menu onde você vai escolher a opção “Divide stereo track”. Desta forma você poderá selecionar apenas um dos dois canais e depois ir para o menu “ Efeito / Amplificação”, podendo adicionar o volume necessário para compensar o problema. No entanto, se a diferença for “escandalosamente” grande, é aconselhável tratar o mais rápido possível de resolver o problema direto na fonte, ou seja, encontrar o problema físico que produz a descompensação. Também tenha em mente que talvez na gravação original a descompensação seja intencional, de modo a produzir algum tipo de sensação ou emoção no ouvinte.
A gravação tem muitos ruídos estranhos
Isto pode acontecer por várias razões: sujeira acumulada que você não limpou, deterioração física do disco ou qualidade questionável de algum elemento na cadeia de áudio. O ponto principal aqui é que você perceba que há mais ruído na gravação do que deveria.
Você pode usar as duas ferramentas que o Audacity tem para reduzir um pouco o ruído. O primeiro que você tem para efeito e redução de ruído é o Noise Reduction. Este tipo de ferramenta funciona em dois passos: primeiro você tem que configurar o nível de ruído e em seguida pedir para excluí-lo. Para entender “o que é o ruído”, primeiro selecione um fragmento de áudio antes e depois que a música começar. Em um dos silêncios onde não há música, é possível medir a quantidade de ruído de fundo (basta alguns segundos). E quando você já perceber/ conhecer o nível de ruído, você pode configurar o Noise Reduction e aplicar o resultado selecionando a música inteira. Utilize o preview de efeito para comparar com as diferentes configurações. E quando você achar que o resultado está bom, clique em OK para processar a faixa.
Embora a Audacity tenha uma ferramenta para eliminar cliques e ruído, ela é muito simples e por você ter feito a digitalização, não obterá resultados favoráveis. Se você quiser um processo automático, recomendo que utilize uma ferramenta profissional, especificamente os plugins Waves do pacote de restauração, que tem um preço bem em conta para o nível de resultados que oferece. Se você comprar o pacote, já vem incluído x-cracle e x-noise, que é um Noise Gate (porta de ruído) que funciona bem melhor do que os do Audacity. O X-Crackle é o plugin certo para esta tarefa e você também pode comprá-lo separadamente, caso não queira investir no pacote inteiro. O bom deste plugin é que, ao clicar na interface no botão “Difference”, você só pode ouvir o que está excluindo e saber se, além dos cliques e pop ups, você está excluindo parte da música que não deseja eliminar.
Se você não quer gastar dinheiro em um plugin de processo automático, você pode escolher fazê-lo manualmente. Você vai precisar de tempo e paciência, mas é a maneira mais precisa de fazê-lo. Basta ouvir a gravação e quando você detectar um clique ou um ruído que deseja eliminar para a gravação, use a ferramenta de lupa para expandir a forma de onda na área de ruído, vá ampliando até ver o ruído claramente e então selecione o pedacinho da onda de áudio onde está o ruído e clique em “Efeito / Reparar”. A ferramenta só funciona com fragmentos de 128 amostras no máximo. Se em um segundo tomarmos 48.000 amostras, imagine o tamanho máximo do fragmento que você deve localizar para que esta ferramenta funcione. Se você fizer contas e cálculos, é provável que você chegue à conclusão de que investir no plugin para um processo de qualidade automatizado será mais barato do que todas as horas que você irá dedicar fazendo manualmente.
Terminamos esta parte da matéria e podemos concluir que algumas pessoas não processam o áudio digitalizado de um vinil para limpá-lo, pois consideram que esse processo deteriora de uma forma ou de outra uma parte da música, além de “filosoficamente” ir contra o princípio do prazer de se ouvir um som de vinil com todos os seus pop ups ou cliques, que fazem do vinil um meio único na música. Esta posição é totalmente respeitável. E uma boa sugestão é: sempre mantenha a gravação original do vinil e a versão editada. Talvez um dia você se arrependa de ter editado o áudio… ou talvez você aprenda a fazê-lo melhor ou, quem sabe, você possa investir em melhores ferramentas no futuro.
Como devo salvar o som gravado e editado?
Salve seus arquivos de áudio de preferência no formato AIFF, pois é compatível com a marcação de metadados no formato ID3 patrão. Muitos programas podem inserir tags (etiquetas) no arquivo WAV, mas não é algo suportado com um único padrão, você pode encontrar algum problema de compatibilidade em algum software para colocar tag ou que não possa ler a tag, colocada anteriormente na música. Quando você salvar o arquivo, mantenha a mesma resolução, já que o software DJ e CDJ não lhe darão problemas com os arquivos de resolução de 24bit/48,000Khz ou 24bit/44.000Khz. De qualquer forma, caso este formato permita, insira e edite metadados no Audacity.
E a questão do dithering: salvar um arquivo gravado em 24 bits a 16 bits?
Esta é uma pergunta que muitos se fazem, se houver algum problema ao salvar em um bit de resolução inferior à que gravamos. Este processo injeta o ruído de áudio que mascara possíveis erros de quantificação no processo de conversão de 24 para 16 bits. Esses erros podem ser ouvidos em momentos de silêncio em uma música, momentos em que um único instrumento permanece depois que todos os outros são silenciados, ou no final de um fade out no f inal de uma música, e é percebido como uma espécie de distorção digital em volume muito baixo. No caso em questão, ousaria dizer que o processo de dithering é “opcional”, e que, em qualquer caso, pode depender do tipo de música que você está digitalizando. Se você está digitalizando música com uma dinâmica muito “apertada” e constante, algo muito comum nos últimos anos nas músicas eletrônicas, onde a “guerra de loudness” impactou muito e tudo está muito comprimido e muito próximo de 0dB, o desvio não parece necessário, já que esses erros de quantização são completamente mascarados pela música no momento da conversão. Caso você esteja digitalizando música com uma dinâmica variável e com momentos de silêncio, você pode considerar a possibilidade de usar esse tipo de processo. A sugestão é fazer a prova, até porque se digitalizava música dance dos anos 80 claramente utilizando a técnica de mastering e a questão dos volumes naquela época eram diferentes.
Em relação aos formatos de áudio comprimidos, se você utiliza um software para tocar ou equipamentos tipos CDJ compatíveis com o FLAC, você pode converter a sua música neste formato com toda a tranquilidade porque nada vai alterar. Não converta o vinil digitalizado em MP3, pois você trabalhou muito para preservar a integridade do som o tanto quanto possível. Também não use o AAC, pois é um formato que preserva o som melhor do que o MP3 usando o mesmo espaço, mas ainda é um formato com perdas.
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